MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

segunda-feira, 12 de abril de 2021

Doutrina Biden: fraqueza explícita diante dos adversários.

 



No complexo jogo geopolítico, Biden expõe uma fragilidade constrangedora diante da China e da Rússia. Ana Paula Henkel via Oeste:


Em meu artigo da semana passada, compartilhei algumas notícias sobre as políticas internacionais do presidente Joe Biden e fizemos juntos uma reflexão sobre o papel dos Estados Unidos no tabuleiro geopolítico atual. Abordamos a crise histórica na fronteira sul do país e a aparente fragilidade — não apenas física — do 46º presidente da nação mais poderosa do mundo no trato das questões sensíveis e importantes com países como o Irã. O tom para as relações internacionais do novo governo democrata já foi dado, e a orquestra, infelizmente, parece desafinada e sem maestro.

Não é mais nenhum mistério, tampouco especulação, que a China investe voraz e globalmente na estratégia de se tornar o país mais influente do planeta. E, para isso, é preciso tirar o Tio Sam da sala. É tradição na história norte-americana que os presidentes desenvolvam suas “doutrinas” de política externa, projetadas para refletir os desafios enfrentados pelas relações internacionais e para propor soluções no campo geopolítico. A prática começou com a Doutrina Monroe, em 1823, e continuou com o corolário Roosevelt, introduzido por Theodore Roosevelt em 1904.

A tradição no período pós-Segunda Guerra Mundial seguiu com a Doutrina Truman, em 1947, sob a qual os EUA forneceram apoio aos governos da Grécia e da Turquia como parte de uma estratégia da Guerra Fria para manter ambas as nações fora da esfera de influência soviética. Logo depois, a história foi marcada pelas doutrinas Eisenhower, Kennedy, Johnson, Nixon e Carter. Todas definiram as abordagens de política externa desses presidentes em momentos desafiadores da História.

Nos anos 1980, a Doutrina Reagan foi uma estratégia implementada pela administração do 40º presidente para reduzir a influência global da União Soviética no final da Guerra Fria. Sob a Doutrina Reagan, os Estados Unidos ajudaram explícita ou extraoficialmente guerrilhas anticomunistas e movimentos de resistência contra governos marxistas na África, na Ásia e na América Latina. Um dos objetivos era sinalizar que qualquer inimigo da América e do Ocidente estaria correndo riscos.

Até presidentes considerados fracos no campo da política externa tiveram seus dias de um Tio Sam firme, que impunha respeito. Mesmo com a catastrófica condução no caso dos reféns na embaixada de Teerã, evento que se arrastou por mais de quatrocentos dias (não deixe de assistir ao filme Argo, de 2012), a administração de Jimmy Carter chegou a prover assistência militar secreta aos mujahidins do Afeganistão. Foi um esforço para expulsar os soviéticos do país, ou pelo menos aumentar o custo militar e político da ocupação da URSS na região.

E foi em 2008 que a nação que muitos consideram racista — são apenas 13% de negros numa população de 330 milhões de habitantes — elegeu um presidente negro. E depois o reelegeu. Com dois mandatos na Casa Branca, Barack Obama tinha tudo para deixar um legado de sucesso. Carismático, com excelente oratória, imagem e discursos fortes, tinha aquele ar presidenciável. O que poderia dar errado? Tudo. Eu poderia usar de certa diplomacia para descrever quem foi Barack Obama para os EUA e o Ocidente, mas terei de ser direta. Barack foi uma enganação.

Como um dos presidentes mais inclinados para a esquerda no espectro político-ideológico da História dos Estados Unidos, Barack Obama, com suas políticas, deixaria exultante o mais ferrenho eleitor do Psol. Foram políticas embaladas em retóricas fofas que ajudaram a enterrar o antigo Partido Democrata de John F. Kennedy — medidas que trouxeram à luz do dia o cataclismo da facção de Alexandria Ocasio-Cortez e sua turma louca da extrema esquerda.

Barack, o sonho de consumo de todo liberal falsificado no Brasil, não passa de um engodo mundial. Como tal, seu legado foi a passagem do bastão das políticas vazias e fracas para o seu vice, que agora é o homem mais poderoso do mundo. Do alto da incômoda e bizarra fragilidade e incompetência, Joe Biden segue firme na perigosa mensagem de fraqueza perante players geopolíticos importantes e perigosos como Irã, China, e mesmo uma enfraquecida Rússia.

Durante a campanha presidencial do ano passado, foi comovente o esforço conjunto das big techs e de veículos da velha imprensa para esconder os escândalos que envolvem Hunter Biden, filho do então candidato — dossiês com provas consistentes indicaram relações nada republicanas entre Hunter e autoridades da Ucrânia e da China. Já não é mais nenhum mistério que a família Biden possui laços com empresas chinesas — leia-se ditadura chinesa — que vão bem além do que os norte-americanos gostariam. Mas o problema não para por aí. Esses laços amarrando as mãos do Tio Sam?

A China está envolvida até o pescoço com sistemáticos roubos de patentes e direitos autorais dos EUA, viola descaradamente acordos comerciais, manipula sua moeda, despeja produtos abaixo do custo nos mercados mundiais. Mais: investe na guerra cibernética, expropria a tecnologia ocidental e bloqueia informações precisas sobre as origens da covid-19. Depois que o malcriado do Twitter se mudou da Casa Branca, nada, absolutamente nenhum desses pontos, cruciais na atual Guerra Fria, foi mencionado por autoridades do governo em reuniões ou coletivas de imprensa.

A conta para os chineses é simples: se a China distribui dinheiro, ela acredita que é dona do destinatário. E não estamos falando apenas da família Biden. Nos últimos cinco anos, a Universidade de Nova York recebeu cerca de US$ 47 milhões em doações da China. O Departamento de Educação dos Estados Unidos advertiu recentemente a Universidade de Stanford por não ter declarado mais de US$ 64 milhões em doações de fontes chinesas desde 2010. Não é surpresa que a China tenha enviado recentemente um pesquisador visitante a Stanford, que acabou identificado como agente dos militares chineses e preso pelas autoridades federais por ter mentido em seu processo de visto e entrada nos EUA.

A China anda a passos largos para destruir de vez qualquer resquício de democracia em Hong Kong, pode ter destruído a cultura do Tibete, e comete atrocidades como colocar minorias muçulmanas em “campos de reeducação” — na verdade, campos de concentração. Além disso, o país discrimina sistematicamente os visitantes africanos. Cada vez que norte-americanos preeminentes, como atletas, celebridades e atores desmiolados, condenam os Estados Unidos por um suposto racismo, os chineses racistas e genocidas apenas aplaudem. A China está em uma corrida para alcançar a hegemonia global e precisa buscar uma opinião mundial favorável até alcançar poder militar e econômico superior.

Há duas semanas, em Anchorage, no Alasca, diplomatas chineses demoliram o secretário de Estado, Antony Blinken, e o conselheiro de Segurança Nacional Jake Sullivan numa reunião transmitida para todo o mundo. A mídia fez o possível para minimizar a situação constrangedora, mas era impossível ignorar o desrespeito demonstrado aos EUA. Desde que o recém-eleito presidente John Kennedy foi humilhado, em 1961, na cúpula de Viena pelo homem forte da União Soviética, Nikita Khrushchev, os diplomatas norte-americanos não haviam sido maltratados por um governo comunista.

Os diplomatas chineses usaram as próprias declarações do Partido Democrata sobre quão corrupto, racista e irremediavelmente perverso são os Estados Unidos. A mensagem, incansavelmente repetida pela esquerda em 2020, de que os negros são rotineiramente caçados nas ruas, regularmente mortos pelas forças policiais e que não têm direitos foi a deixa para a bofetada chinesa. A pá de cal diplomática aconteceu depois que os norte-americanos tentaram condenar a China por suas políticas econômicas e abusos contra os direitos humanos, inclusive contra o grupo étnico uigur. A China, com a calma de quem sabe quem está dando as cartas na mesa, disse que os Estados Unidos não estão em posição de proferir sermões. Ouch.

E, como humilhação pouca é bobagem, numa recente entrevista ensaiada para o canal de tevê norte-americano ABC, Joe Biden, demonstrando perturbadora falta de conexão com o assunto em pauta, chamou o presidente russo Vladimir Putin de “assassino” e “sem alma”. Uma coisa seria se houvesse algum propósito por trás da declaração hostil de Biden, mas suas palavras, ditas quase gaguejando, não pareciam vinculadas a nenhum objetivo estratégico de política externa. Putin aproveitou ao máximo a asneira dita pelo “para sempre vice de Obama”. Depois de algumas reflexões filosóficas e sarcásticas sobre como Biden pode estar projetando suas próprias incoerências no cargo, o russo disparou que os Estados Unidos têm uma história sombria e, rapidamente, desafiou Biden para um debate público ao vivo pela internet, completando: “E quanto mais cedo for feito, melhor, mesmo que Biden precise de um pouco de descanso e tempo para se preparar”.

Biden até hoje, depois de três meses na Casa Branca, não encarou uma coletiva de imprensa sem jornalistas previamente escolhidos com perguntadas checadas. A eterna sombra de Obama não vai poder evitar a imprensa para sempre. Em breve, ele terá de enfrentar reuniões improvisadas com líderes estrangeiros. Estará preparado para a principal arena global depois de um ano de bajulação da mídia?

A Doutrina Biden coloca sangue na água. E os tubarões já perceberam isso. Os norte-americanos e o mundo ainda sentirão falta do agente laranja na Casa Branca e sua doutrina malcriada de impor respeito e paz por meio da força.
 
BLOG  ORLANDO  TAMBOSI

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