RAFAEL GARCIA - FOLHA DE SÃO PAULO
ENVIADO ESPECIAL A BOSTON
Quando a multinacional Pfizer contratou John Clark, um ex-funcionário de
alto escalão da Alfândega dos Estados Unidos, para coordenar sua
divisão de segurança e propriedade intelectual em 2008, a empresa
colecionava relatos de casos de falsificação de 20 de suas drogas,
incluindo o Viagra, a droga mais visada no mundo por esse tipo de crime.
ENVIADO ESPECIAL A BOSTON
Cinco anos depois, 60 drogas do laboratório estão sendo alvo do mesmo crime. Não existe um levantamento preciso sobre o mercado de medicamentos falsos, mas a opinião de sanitaristas, laboratórios e agências de fiscalização é que há uma crise.
"O problema está crescendo exponencialmente agora", afirma Clark. "A estimativa geral é de que esse mercado movimenta US$ 75 bilhões de dólares por ano."
Clark foi um dos palestrantes num seminário promovido, no último domingo, pela AAAS (Associação Americana para o Avanço da Ciência), que reuniu cientistas e juristas em Boston.
Um relatório do Instituto de Medicina, a divisão de saúde da Academia Nacional de Ciências dos EUA, pede à Organização Mundial da Saúde que lidere a produção de um tratado internacional para combater o problema.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
No Sudeste Asiático, onde a malária também é endêmica, 36% das drogas contra a doença são falsas, estima um estudo do sanitarista Paul Newton, da Universidade de Oxford, que coordenou o seminário em Boston.
O Brasil também é bastante afetado: é o décimo país com maior número de detenções ou prisões por falsificações e o quarto no ranking de incidentes mantido pelo Pharmaceutical Security Institute, conselho de combate a danos de propriedade intelectual que reúne as 25 maiores farmacêuticas do mundo.
VENENO
Os medicamentos falsificados afetam a saúde pública não só por serem inócuos, pois muitos deles são deliberadamente nocivos. Alguns contêm de tijolo e gesso a tinta com metais pesados, pesticidas e veneno de rato.
Ao analisar um lote de drogas anti-HIV, o bioquímico Facundo Fernandez, do Instituto de Tecnologia da Georgia, descobriu que a pílula tinha um antibiótico que nada tem a ver com prevenção da Aids. Por que usar um ingrediente ativo alterado, se é mais barato não usar nada?
"Se você toma um remédio e ele não tem gosto de remédio nem efeitos colaterais, você começa a desconfiar muito rápido."
O bioquímico desenvolve métodos para analisar drogas, um dos principais gargalos para a fiscalização. Os equipamentos que revelam rapidamente a composição de uma droga são grandes máquinas de laboratório, e investigações de campo têm de usar aparelhos menores.
O principal problema para detectar drogas falsas hoje é a alta qualidade das cópias das embalagens.
"Os inspetores de remédio na maior parte do mundo não carregam nenhuma ferramenta a não ser seus próprios olhos", diz Newton, de Oxford.
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