Essa aliança insólita, que obteve vitória com a diferença de apenas um voto, só foi possível porque todos esses partidos tinham uma coisa em comum: o desejo de interromper o longo reinado de Netanyahu como premiê de Israel. Diogo Schelp para a Gazeta do Povo:
Foi
ratificado neste domingo (13), pelo Knesset, o parlamento de Israel, a
nova coalizão que encerra doze anos seguidos de governo de Benjamin
Netanyahu. Em seu lugar entra Naftali Bennett, de 49 anos, o primeiro
judeu ortodoxo a se tornar premiê de Israel, que chega ao poder por meio
de uma aliança com políticos moderados e com um árabe-israelense a
quem, até pouco tempo atrás, ele chamava de "apoiador de terroristas".
A mundo dá voltas e a política israelense não é para amadores. Mas quem é o homem que conseguiu esse feito?
Bennett
pertence a um partido de direita nacionalista que se opõe à criação de
um Estado palestino e defende a anexação definitiva da Cisjordânia a
Israel. Seus pais são americanos que, na juventude, eram esquerdistas,
mas depois de se mudar para Israel, no final dos anos 60, mudaram de
posicionamento político, voltando-se para a direita nacionalista.
Na
juventude, durante o serviço militar obrigatório, Bennett integrou uma
força especial de contraterrorismo e resgate de reféns em território
inimigo. Durante uma missão na aldeia de Qana, no sul do Líbano, em
1996, Bennett e a unidade com 67 militares que ele comandava foram
atacados por combatentes do Hezbollah, a milícia xiita libanesa, com
tiros de morteiros.
Bennett
pediu reforço por radio, e a artilharia israelense bombardeou os
responsáveis pelo ataque. Mas alguns terroristas do Hezbollah haviam se
escondido em um abrigo da ONU. As forças israelenses revidarem mesmo
assim, e 106 civis morreram no que ficou conhecido como o "massacre de
Qana".
Depois
do serviço militar, Bennett formou-se em Direito na Universidade
Hebraica de Jerusalém e, já casado, mudou-se para Nova York, nos Estados
Unidos, onde criou uma empresa de software que foi vendida cinco anos
depois por 145 milhões de dólares.
Já
milionário, voltou a Israel para atuar na Guerra do Líbano de 2006 como
reservista. Foi quando começou a dar os seus primeiros passos na
política, ao aceitar o convite para ser braço direito de Netanyahu. Em
2008, teve o primeiro desentendimento com o chefe, depois de uma briga
com sua mulher, Sara Netanyahu. (A rivalidade entre eles nunca
arrefeceu, a ponto de, em 2019, ela sugerir a jornalistas que
investigassem os segredos de alcova de Bennett.)
Bennett
deixou o Likud, partido de Netanyahu, em 2012, filiando-se a uma
legenda ortodoxa, que ele passou a liderar e pela qual foi eleito para o
Knesset no ano seguinte. Também em 2013, vendeu mais uma empresa de
softwares, que ele havia criado em Israel, por 130 milhões de dólares.
Em
coalizão para compor o governo de Netanyahu, ocupou os ministérios da
Economia, dos Serviços Religiosos, de Jerusalém e de Assuntos da
Diáspora e, por último, da Educação, em 2015.
As
coisas azedaram de vez nas relações com o ex-mentor em 2018, quando
Bennett quis ocupar o Ministério da Defesa, mas Netanyahu decidiu ficar
ele próprio com o cargo, acumulando com o de premiê de Israel.
Bennett
decidiu, então, criar um novo partido com uma agenda anti-Palestina,
que acabou sem cadeiras no parlamento na eleição seguinte. Por fim,
juntou alguns partidos religiosos para criar o Yamina, que conquistou
sete cadeiras na última eleição.
Para
conseguir derrotar o Likud de Netanyahu, Bennett precisou fazer uma
aliança com oito partidos com agendas políticas absolutamente distintas.
Dois são de esquerda, dois são moderados, três, de direita — e tem até
uma agremiação árabe-israelense, liderada por Manssur Abbas, a quem
Bennett já chamou de "apoiador de terroristas".
"Mudei
de ideia a respeito de Abbas, é um homem decente, um líder corajoso",
disse Bennett recentemente, aproveitando para esclarecer que, nos
acordos para coalizão e permitirá que ele permaneça no cargo, "não há
uma única palavra sobre nacionalismo".
Essa
aliança insólita, que obteve vitória com a diferença de apenas um voto,
só foi possível porque todos esses partidos tinham uma coisa em comum: o
desejo de interromper o longo reinado de Netanyahu como premiê de
Israel. Mas o novo governo enfrentará a dura oposição justamente de
Netanyahu, que já avisou que não deixará a política.
Se
a união de esquerdistas, moderados, direitistas e de um pequeno grupo
de parlamentares árabes sobreviver às próprias contradições entre eles,
dentro de dois anos, segundo o compromisso assumido por Bennett, o cargo
de premiê de Israel deverá ser cedido para o moderado Yair Lapid.
Até lá, muita areia vai escorrer pelos dedos da conturbada política israelense.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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