Ninguém quer acabar com o capitalismo, querem achar um nicho com todas as cores do arco-íris, cheio de amigues e iPhones. Luiz Felipe Pondé para a FSP:
Olhem que lindo esse trecho de uma carta do Lênin escrita
em agosto de 1918 em meio à guerra civil, após o golpe de outubro de
1917 —a fonte é a biografia do Lênin escrita por um general soviético e
historiador, Dmitri Volkogonov:
“Camaradas! O levantamento kulak (camponeses ricos) deve ser esmagado sem piedade [...] Deixem-me exemplificar:
1) Enforquem um número não menor que cem [...]
2) Escrevam seus nomes [...]
3) Confisquem seus cereais [...]
4)
Façam de modo a que, ao longo de centenas de quilômetros, as pessoas
possam ver, saber, tremer e apregoar: eles matam e continuarão a matar
[...]
Cumprimentos, Lênin.”
Imagino um woke lendo isso. Faria xixi nas calças orgânicas.
Você não sabe o que é um woke? Um woke é uma pessoa muito bacana. Um seguidor da Greta Thunberg.
A
expressão significa acordou do verbo “to wake” (acordar). Mas, ao longo
do tempo, acabou por ser uma expressão usada para a esquerda cultural,
oriunda da máxima “stay woke”.
A
ideia de desperto, como alguém que despertou para a verdade, é antiga e
era usada pela heresia gnóstica cristã no início da era comum ou
cristã. Os gnósticos eram homens e mulheres que achavam que o mundo fora
criado por um deus mau e a única saída era fugir das cidades e ir morar
no deserto. A fuga do mundo.
Críticos
os acusavam de matar bebês para não aumentar os números das vítimas
desse deus mau e de fazer sexo antinatural —leia-se anal e oral— para
não engravidar as mulheres.
Não
suponho que os wokes de hoje tenham a mínima ideia do que seja um
gnóstico antigo. Eles foram perseguidos sistematicamente pelo que veio a
ser o cristianismo oficial.
Os
wokes estão ocupados em fazer geleia natural e em ensinar as crianças a
amar todas as cores do arco-íris. Não conseguem lidar com coisas de
gente grande.
Exemplos
da agenda woke: casais em que os homens são egressos das novas
masculinidades e que sofrem de depressão pós-parto, coitadinhos; pessoas
que falam “pessoas que dão à luz” porque mãe não é termo inclusivo; que
usam combustível vegano, e têm cachorros trans.
A
verdade é que o cruel Lênin os teria considerado mais uma degeneração
burguesa e mandaria enforcá-los com gosto. Mas temos que reconhecer que
as realidades humanas são históricas e, portanto, pautas que eram
queridas aos bolcheviques —gente que nasceu no século 19!— não podem
ser, evidentemente, queridas por alguém que vive no século 21, né?
Na época, os bolcheviques queriam destruir o capitalismo, a esquerda de hoje é um fetiche cultural
para filhos da elite que brincam de fazer documentários sobre pobres e
para suas mães, que brincam de espiritualidade oriental, enquanto seus
pais continuam sendo burgueses de sucesso.
A verdade é que não há mercado para bolcheviques hoje em dia, só para wokes.
Lênin e sua patota
matavam a rodo. Em meio à fome de 1918, junto com seu Politburo (comitê
central do partido comunista da extinta URSS), ele chegou mesmo a
recusar dar grana para crianças que morriam de fome, enquanto
encaminhava joias para financiar a revolução na Europa.
Para
ele, de nada adiantava gastar dinheiro com crianças em meio a tantas
mortes, mais importante era alimentar a revolução na Europa. O que um
woke fofo diria disso?
Minha hipótese é que o mercado engoliu a esquerda.
Não é à toa que uma das pautas mais importantes para os wokes —ser os inquisidores do politicamente correto—
atravessou as fronteiras ideológicas e hoje alimenta os departamentos
de marketing das empresas. A esquerda de hoje é um fetiche cultural,
algo que cabe num comercial de banco.
Mas será que a justificativa de mudança histórica se aplica ao método revolucionário bolchevique em si?
O
argumento da mudança histórica só se aplica à recusa da violência
revolucionária bolchevique porque, na verdade, o espírito revolucionário
atrofiou, e não porque a esquerda evoluiu. A humanidade não evolui
moralmente.
Ninguém
mais quer acabar com o capitalismo. Quer, sim, achar um nicho de
mercado para chamar de seu: e que seja com todas as cores do arco-íris,
esteja repleto de amigues e com iPhones aos montes.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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