Só cretinos fundamentais acham possível enfrentar animais selvagens e feras humanas com apelos e técnicas de persuasão, afirma Augusto Nunes (a propósito, recomendo, a quem no o fez, a leitura do artigo aqui publicado ontem: A arma de fogo é a civilização):
Aprendi a lidar com armas de fogo graças a Nossa Senhora Aparecida.
Não, não estou brincando com coisa séria. Explico-me. Em Taquaritinga,
onde nasci, o povo festeja o dia da padroeira do Brasil soltando rojões.
Num certo 12 de outubro, meu pai resolveu trocar os fogos de artifício
por um Taurus calibre 32. E, enquanto homenageava a santa com tiros de
revólver, ensinou os filhos a manejarem sem perigo e com destreza
objetos que tanto atormentam os pacifistas de botequim.
A partir daquele ano, as lições foram ministradas em todos os dias de
foguetório. Mantenham o revólver apontado para o chão, alertava meu
pai. Examinem o tambor e vejam se existe alguma bala no cano com os
dedos longe do gatilho. Apoiem na outra mão a mão que empunha o cabo. E
atirem sempre para o alto, em espaços abertos. Essas aulas práticas
bastaram para que aprendêssemos que armas devem ser usadas com cuidado e
em ocasiões especiais. Nenhum de nós virou pistoleiro, ninguém na
família saiu pelas ruas da cidade querendo decidir pendências a bala.
Graças a métodos semelhantes, sucessivas gerações de
taquaritinguenses aprenderam a manejar armas com a naturalidade de quem
empina uma pipa. Existe ao menos uma em cada casa. Espingardas
proliferam na zona rural, ao alcance dos braços de agricultores
dispostos a usá-las contra onças ou feras humanas. Mas não passa de um
dígito o número de mortes por armas de fogo contabilizadas a cada ano.
Esse número é invariavelmente inferior ao de casos de tentativas de
assalto ou ataques de bichos ferozes frustrados por um mero disparo de
advertência.
No referendo de 2005, passou de 80%, em Taquaritinga, o contingente
de eleitores que votaram a favor do direito de ter em casa uma arma.
Repetiu-se por todas as regiões brasileiras a derrota dos que acham que
devemos enfrentar desarmados bandidos tão ferozes quanto animais
selvagens. O decreto assinado ontem pelo presidente da República,
portanto, atendeu à vontade da grande maioria dos brasileiros.
Defender a própria vida é um direito que jamais será revogado.
Pergunto: é possível exercê-lo recorrendo exclusivamente a apelos,
técnicas de persuasão, ou mesmo a socos e pontapés? Só cretinos
fundamentais acham que sim.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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