Vicente Cândido, o petista relator. |
"Trapaça enxuta", texto publicado por J. R. Guzzo em Veja.com:
Sempre que aparece no
noticiário a informação de que os políticos deste país estão fazendo
alguma coisa “enxuta”, você já pode contar: estão preparando mais um
golpe do vigário contra os seus interesses, e particularmente contra o
seu bolso. A palavra “enxuta”, no dialeto do governo e de todos os
partidos, sem exceção, quer dizer que a medida a ser tomada vai se
resumir a meia dúzia de coisinhas que não resolvem absolutamente nada
daquilo que teria realmente de ser resolvido; em compensação, essas
mesmas coisinhas sempre trazem benefícios materiais, diretos e imediatos
para suas excelências. Esse modus operandi, como se diz nas delegacias
de polícia, tem uma dupla vantagem. De um lado, fornece aos senhores
parlamentares da extrema esquerda, da extrema direita e do extremo
centro uma desculpa prévia por não aprovarem as providências que tinham a
obrigação de aprovar – afinal, trata-se de uma coisa “enxuta”,
resumida, e portanto não há espaço para incluir ali as decisões
importantes, que precisam ser estudadas com calma e devem ser tomadas
com prudência, no futuro. De outro lado, permite que eles enfiem no
projeto, sem chamar muita atenção, as mudanças que realmente estão
querendo para já – as mais urgentes e mais rentáveis. Como se trata de
uma operação “enxuta”, da qual nem vale a pena falar muito, fica mais
fácil esconder os seus truques lá dentro: se tivessem de socar de uma
vez só tudo o que ambicionam, estariam correndo o risco de uma overdose.
A “reforma política” prestes a ser apreciada pelo Congresso
é mais uma bela obra na arte de roubar no jogo com a desculpa de “fazer
o possível agora, e o ideal mais tarde”. Na realidade, o que se tem é
safadeza já, e o correto nunca. Essa reforma é o que há, em matéria de
mudança “enxuta”. Não vai mexer (fica para “depois”, a partir de 2020,
2030, etc.) em nenhuma das aberrações mais infames da atual legislação
eleitoral – fim do voto obrigatório, fim do horário político obrigatório
no rádio e tevê, fim dos partidos de aluguel, fim dos vices e por aí
afora. “Não é o momento” para mudar nada disso, dizem os nossos
representantes. Considerou-se um exagêro, por exemplo, exigir que um
partido tenha pelo menos 3% dos votos nas eleições para continuar
existindo – ou melhor, para continuar metendo no bolso o dinheiro que o
erário distribui através do “fundo partidário”.
Basta que consigam 1,5%. É bom para os pequenos, claro, e para os
grandes, que querem garantir a existência no Congresso de um estoque de
votos sempre prontos para a compra e venda, na hora de aprovar ou
rejeitar alguma coisa no plenário.
Sobra o que, então,
na “reforma enxuta”? Exatamente aquilo que se podia esperar. Inventaram
um negócio chamado “distritão”, que 99% da população não sabe o que é,
para evitar o perigo do voto distrital,
adotado em todas as democracias que funcionam – a única mudança
realmente capaz de melhorar o sistema eleitoral criminoso que vigora no
Brasil. Mais que tudo, naturalmente, foram direto para cima do Tesouro Nacional:
propõem a criação de mais um fundo para o “financiamento público” das
campanhas eleitorais, que será sustentado com os impostos pagos pelos
eleitores. Estão querendo dinheiro grosso: de 3,5 a 4 bilhões de reais
já em 2018, ou até cinco vezes mais os 800 milhões por ano do atual
“fundo partidário”. O pai da proposta é um deputado do PT – mas os
partidos adversários são cúmplices integrais desse roubo. Para completar
o serviço, Sua Excelência pretende chamar essa trapaça de “fundo de
financiamento à democracia”. Como se diz, é juntar o insulto à injúria.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
Nenhum comentário:
Postar um comentário