Com fabricação de
"bombinha" nuclear para ser transportada em mísseis, o ditador da Coreia
do Norte dá o passo decisivo que será respondido com "fúria e fogo".
Texto de Vilma Gryzinski (Veja.com):
Tamanho é importante
quando se trata de bombas nucleares dirigidas para alvos a grande
distância. Transportadas por mísseis de longo alcance, elas precisam ser
menores e mais leves.
Ao miniaturizar suas
bombas experimentais, a Coreia do Norte passou a reunir as duas
condições para um ataque estratégico: os foguetes que estão sendo
testados com grande estardalhaço e as ogivas de tamanho adequado. Estas
foram obtidas em segredo, exposto por serviços de inteligência dos
Estados Unidos e do Japão.
É por isso que o
presidente Donald Trump subiu o tom do discurso para um nível quase
crítico e disse que os Estados Unidos reagirão com “fúria e fogo”. O que
parecia ser a montagem de uma operação bélica no prazo de mais ou menos
um ano, caso a diplomacia continue a falhar como vem falhando, pode ter
que apressar o calendário.
À medida em que as
bombas nucleares foram ficando mais destrutivas, a maioria delas também
diminuiu de tamanho para ser instalada em mísseis. Os leviatãs
apocalípticos como a Tsar Bomba, a maior da história do mundo pós-fissão
atômica, eram feitos mais para testes – e também demonstração de força.
O monstro soviético,
chamado pelos russos de Ivan, tinha uma carga de 50 megatons e foi
testado em 1961, numa época em que o pioneiro arsenal americano ainda
estava bem à frente dos russos.
MENININHO E GORDO
A “bomba padrão” dos
Estados Unidos hoje, instalada em mísseis intercontinentais, é a W80.
Leva uma ogiva termonuclear de 80 centímetros de comprimento e 30 de
diâmetro. Parece um aspirador de pó convencional, apesar do peso de 130
quilos.
As duas únicas bombas
usadas até hoje, em Hiroshima e Nagasaki, para obter a rendição do
Japão, eram quase quatro vezes maiores. A diferença é que foram
transportadas e lançadas por aviões.
Tamanho e peso, por
tanto, não importavam. Os Estados Unidos também já tinham praticamente o
domínio total do espaço aéreo. O bombardeiro B-29, especialmente
adaptado, pilotado por Paul Tibetts, que o batizou com o nome da mãe,
Enola Gay, decolou de uma pista nas Ilhas Marianas e voou durante seis
horas até chegar a Hiroshima em 6 de agosto de 1945. Dois aviões do
mesmo tipo o acompanhavam.
Num engradado de
madeira ia Little Boy, ou Menininho. O apelido fazia referência a
Franklin Roosevelt, o presidente que havia morrido três meses antes (e,
quando criança, usou vestido e cabelo comprido até os cinco anos). A
bomba tinha o formato de uma baleia. Media três metros , com 70
centímetros de diâmetro.
A massa crítica era
urânio 235, com a reação nuclear em cadeia induzida quando a bomba em
si era disparada através de um mecanismo similar ao de um cano de
canhão. Ao todo pesava mais de quatro toneladas.
Devido à recusa do
regime imperialista japonês em aceitar a inelutável derrota e proteger
seu próprio povo, em 9 de agosto foi lançada a segunda bomba nuclear,
sobre Nagasaki.
Fat Man, o Gordo
(referência a Winston Churchill), tinha forma de um barril compactado,
com 3,5 metros de comprimento e 1,5 de diâmetro. O núcleo era de
plutônio, acionado por dois anéis com 64 cargas explosivas
convencionais. A onda de choque provocava a reação em cadeia.
O modelo de guerra
nuclear mudou de padrão quando a União Soviética, através de espionagem e
pesquisa, entrou no jogo. Com baterias antiaéreas, caças operacionais e
interceptadores, sem contar as enormes distâncias entre os dois países,
a corrida estratégica se voltou para os mísseis capazes de voar a
longas distâncias. As ogivas foram aumentando em capacidade de
destruição e diminuindo de tamanho.
É nesse ponto, ainda que com tecnologia muito menos consolidada, chegou a Coreia do Norte.
LINHA VERMELHA
A pergunta mais
constante sobre o país é: por que os Estados Unidos não dão logo uma
lição daquelas em Kim Jong-Un, ironicamente um menininho gordo, e acabam
com um programa nuclear cada vez mais perigoso, mesmo que usado apenas
como instrumento de ameaça.
A essa altura, todo
mundo tem uma ideia razoável dos riscos envolvidos. Mesmo usando apenas
armamentos convencionais, a Coreia do Norte pode causar massacres
hediondos, especialmente em Seul, a altamente vulnerável capital
sul-coreana.
Mesmo o mais
eficiente conjunto de ataques-relâmpago para desativar todo o sistema
bélico norte-coreano, missão que os americanos têm condições de fazer em
questão de horas, deixaria janelas de oportunidade para uma reação
mortífera.
Embora ninguém possa
duvidar que os modelos de desativação do inimigo estejam sendo
aperfeiçoados em ritmo bem acelerado. A hipótese da decapitação, com uma
eliminação a jato do próprio Kim Jong-Un, não é descartada, mas tem
desvantagens.
Até acreditar que
querido, amado, idolatrado – e acima de tudo temido – líder tenha
realmente ido ao encontro de papai e de vovô, a cúpula militar tremeria
na base de pavor.
Existe também o
perigo de uma escalada envolvendo a China, patrona do gordinho alucinado
e ainda não convencida a abrir mão de um de seus instrumentos de
intimidação no grande jogo do controle regional.
Pelos cálculos mais recentes, a Coreia do Norte já tem cerca de 60 artefatos nucleares.
“Eles irão deparar
com fogo e fúria e, francamente, poder, de um tipo que o mundo jamais
viu”, foram as palavras inflamadas de Trump ao reagir à notícia da
miniaturização das bombas.
Ao dizer isso, ele de
certa forma riscou uma linha no chão: se não fizer nada, fica
desmoralizado. Exatamente como aconteceu com Barack Obama quando não
cumpriu a ameaça de retaliar a Síria se passasse a “linha vermelha” e
usasse armas químicas.
O avanço e o
exibicionismo nuclear de Kim Jong-Un têm influenciado a opinião pública
americana, no geral contrária a intervenções bélicas. Há dois anos, 55%
dos americanos achavam que a Coreia do Norte era uma grande ameaça.
Hoje, são 75%, segundo uma nova pesquisa.
Se o Norte invadisse o
Sul, 62% apoiariam o uso de militares americanos. E apenas 21%
apoiariam um acordo pelo qual a Coreia do Norte interrompesse seu
programa nuclear, embora mantendo o arsenal atômico. Esta seria a única
saída diplomática aparentemente realizável no momento.
A temperatura do forno em que a batata de Kim Jong-Un está assando sobe sem parar.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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