A sub-procuradora Raquel
Dodge foi acusada pelo atual procurador de propor resolução para
prejudicar a Lava Jato. Ela nega e se diz defensora da operação. Seus
apoiadores afirmam que Raquel é alvo de uma guerra suja na PGR para
impedir que o grupo de Janot deixe o poder:
A escolha do sucessor
do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, tem um favorito nos
bastidores de Brasília. Ou melhor, favorita: a subprocuradora Raquel
Dodge. Terceira colocada na eleição interna do Ministério Público
Federal (MPF) em 2015, ela é do grupo de oposição a Janot. E, embora
garanta que dará continuidade à Operação Lava Jato na
Procuradoria-Geral da República (PGR), defendeu recentemente uma
proposta que, na visão do atual procurador-geral, trará prejuízos à
investigação. Além disso, Raquel Dodge estaria sendo apoiada por
figurões da política que são alvos da operação.
Para os apoiadores
dela, contudo, Raquel Dodge não é a vilã da Lava Jato que seus
adversários procuram insinuar que ela será no comando do MPF. E
reservadamente dizem que, ao contrário, a subprocuradora está sendo
vítima de uma guerra suja na PGR para impedi-la de tirar o grupo de
Janot do poder.
A eleição interna do MPF para a chefia da PGR está marcada para o próximo dia 27. Oito candidatos estão na disputa.
Os três mais votados vão compor uma lista tríplice que será encaminhada
para o presidente Michel Temer fazer a escolha final. Ele tem o direito
de não indicar o mais votado. Desse modo, o novo procurador-geral pode,
em tese, ser o segundo ou o terceiro mais votado. Embora desde que o
ex-presidente Lula assumiu a Presidência, em 2003, o primeiro da lista
venha sendo o escolhido, Temer estaria avaliando não optar pelo mais votado.
Fator político
A possibilidade de o
presidente descartar o nome preferido dentro do MPF abre a possibilidade
de a escolha se basear em critérios políticos. E, nesse caso, a favor
de Raquel pesa o fato de ela ser de oposição a Janot – hoje tido como um
inimigo de Temer.
Segundo reportagem desta segunda-feira (19) do jornal O Globo ,
Raquel Dodge teria o apoio de alguns figurões investigados na Lava
Jato: o senador Renan Calheiros (PMDB-AL) e o ex-presidente José Sarney
(PMDB-AP). Ainda de acordo com O Globo, Raquel Dodge ainda seria a
preferida do ministro da Justiça, Torquato Jardim, e do ministro Gilmar
Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF). Mas Temer estaria reticente
em escolhê-la devido à sua “imprevisibilidade”.
Apoio e polêmica
Durante a campanha
pela PGR, Raquel Dodge afirmou que irá apoiar a Lava Jato e que vai
ampliar o número de investigadores e a estrutura disponibilizada para
eles, caso seja necessário.
Apesar disso, ela se
envolveu recentemente numa polêmica sobre o futuro da operação. Em
abril, durante reunião do Conselho Superior do Ministério Público
(CSMP), ela apresentou um projeto
de resolução que, se aprovado, limitaria a cessão de procuradores das
unidades estaduais a operações em andamento – incluindo a Lava Jato.
Sob o argumento de que era preciso preservar o funcionamento das
unidades do MPF, ela propôs que cada unidade do Ministério Público só
poderia ceder 10% dos membros. E disse que isso não afetaria a operação.
Janot irritou-se com a
proposta e disse que ela provocaria impactos negativos: “Esse discurso
de que não vai afetar a Lava Jato é um discurso que tem de ser recebido
com muita ponderação porque, na verdade, ninguém, a não ser aqueles que
participam da investigação, conhece a complexidade, o alcance, a
dimensão, do que representa essa investigação”. Raquel afirmou ter
consultado o comando da Lava Jato, que teria dito que a proposta não
prejudicaria a operação. Contrariado, Janot argumentou que ele, que
coordena a operação na PGR, não havia sido consultado.
Ao fim da sessão do
CSMP, a proposta acabou sendo retirada de votação. E ainda não voltou à
pauta. Mas deixou sobre Raquel Dodge uma nuvem de dúvidas sobre suas
reais intenções em relação à Lava Jato.
Vítima de Janot
Os defensores de
Raquel Dodge afirmam, porém, que sua proposta não tem nada demais e não
vai prejudicar a Lava Jato. A maioria dos candidatos à PGR, por exemplo,
é a favor de haver uma limitação para o número de procuradores cedidos
às operações para que outras atividades essenciais do MPF não fiquem
paralisadas. E o placar no CSMP, quando o projeto de resolução foi
retirado de pauta, demonstra isso: era 8 a 1 a favor da proposta.
Os apoiadores de
Raquel Dodge dizem ainda que ela é vítima de uma guerra interna
orquestrada pelo próprio Janot para manter seu grupo no comando da PGR. A
última edição da revista IstoÉ, por exemplo, trouxe uma reportagem que acusa o procurador-geral de ter ultrapassado os limites no exercício do cargo para prejudicar Raquel Dodge.
Ligações telefônicas interceptadas pela Polícia Federal, no âmbito da
Lava Jato, mostram que a procuradora da República Caroline Maciel, chefe
do MPF no Rio Grande do Norte, alerta o também procurador Ângelo
Goulart sobre o risco de um eventual apoio dele a Raquel na eleição para
a PGR.
Segundo Caroline, “a tática de Janot é apavorar quem está do lado de Raquel”. Apenas uma semana depois da conversa, captada pela PF em 11 de maio, Goulart foi preso a pedido de Janot sob a acusação de participar do esquema de corrupção da JBS.
Em nota, a PGR classificou de “leviana” a reportagem da revista IstoÉ e
informou que”tem como único objetivo tumultuar o processo de elaboração
da lista tríplice para a escolha do próximo chefe do Ministério Público
da União e desgastar a imagem do Procurador-Geral da República em meio
às mais graves investigações sobre corrupção já vistas na história do
Brasil. Por meio do texto, Janot nega perseguição interna no MPF. Também
em nota, a procuradora Caroline Maciel disse “que a revista deturpou as conversas privadas e sigilosas” dela com Goulart.
Ações anticorrupção
A carreira de 27 anos
de Raquel Dodge no MPF, aliás, não credita ninguém a acusá-la de ser
leniente com corruptos. Ela participou, por exemplo, de operações que
investigaram casos rumorosos de corrupção – tal como a Caixa de Pandora,
que desvendou o mensalão do DEM no Distrito Federal e levou pela
primeira vez um governador para a prisão, José Roberto Arruda.
Também esteve na
equipe que participou de uma das primeiras apurações contra um
parlamentar federal: Hildebrando Paschoal, conhecido como “deputado da
motosserra” devido ao modo como esquartejava inimigos. A investigação
levou Hildebrando a ser cassado e condenado por liderar um esquadrão da
morte no Acre.
Raquel Dodge também
se posicionou contra a PEC 37 – proposta de emenda constitucional que
proibia o MP de promover investigações criminais. A PEC, apoiada por
muitos parlamentares, era vista como uma retaliação às ações
anticorrupção desencadeadas pelo Ministério Público. Mas foi rejeitada
pelo Congresso após a pressão popular dos protestos de rua de junho de
2013.
OUTROS TEMAS
Embora o combate à
corrupção seja o principal debate na sucessão de Janot, o novo
procurador-geral da República terá atuação relevante na defesa de outros
assuntos de interesse direto do país. E Raquel Dodge já se pronunciou
sobre alguns deles na disputa pela PGR em 2015. Confira:
Redução da maioridade penal
Em 2013, durante
audiência pública no Senado, disse ser contrária à redução da maioridade
penal porque isso violaria direitos e garantias individuais previstos
na Constituição. “No momento em que a Constituição assume como regra a
maioridade penal, ela dá o direito ao jovem de ser punido apenas quando
for adulto. A Constituição diz que não será permitido emenda que deseja
abolir os direitos individuais. Torná-los imputáveis subtrairia um
direito que é deles hoje”, afirmou à época.
Tráfico de drogas
A subprocuradora
elaborou um estudo em que propõe punições diferenciadas para traficantes
presos com quantidades diferentes de drogas – o que nem sempre ocorre
atualmente.
Salários iguais para mulheres
Em entrevista ao portal UOL
em 2015, Raquel Dodge considerou que a remuneração menor para mulheres
que exercem a mesma função que os homens é uma expressão de preconceito
que deve ser combatida.
Revisão da Lei da Anistia
Na mesma entrevista
ao UOL, disse ser a favor da punição de crimes da ditadura militar
(1964-1985) que não estão abrangidos pela Lei da Anistia – caso dos
chamados crimes permanentes (embora ela não tenha dito quais, o MP
costuma classificar desse modo aqueles casos em que o corpo do torturado
e morto pela repressão não foi encontrado: ainda estaria ocorrendo a
ocultação do cadáver).
Ela ainda disse ser a
favor de que o STF se manifeste sobre a incompatibilidade da Lei da
Anistia com a Convenção Interamericana de Direitos Humanos. Ratificada
pelo Brasil, a convenção estabelece que crimes contra a humanidade nunca
prescrevem e devem ser punidos. É o caso da tortura.
Auxílio-moradia ao MP
Ao UOL, Raquel Dodge
admitiu receber o auxílio-moradia pago aos membros do MPF – considerado
uma benesse injustificável por muitos. “Se não estivesse amparada em
lei, essa verba não seria devida”, disse.
Ela ainda defendeu os
altos salários pagos a promotores e procuradores: “A remuneração do
membro do Ministério Público é acima da média nacional porque é de
interesse público recrutar pessoas bem capacitadas para investigar e
processar diariamente, em juízo, atos de corrupção, lavagem de dinheiro e
outros graves crimes, promover a defesa do regime democrático e de
direitos humanos e zelar por serviços de relevância pública que tenham
qualidade”. (Gazeta do Povo).
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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