José Casado observa, no Globo, que o voto de Gilmar Mendes pode influenciar a maioria no plenário - contra ou a favor dele:
Gilmar Ferreira
Mendes completou na quarta-feira uma década e meia no plenário do
Supremo Tribunal Federal. No fim da jornada, esse conservador de 61 anos
percebeu, mais uma vez, que a toga proporciona muito poder a quem
veste, mas nem sempre um juiz pode tudo.
Por ele, na
quarta-feira mesmo o tribunal teria assumido o papel de moderador da
crise política, confrontando o rumo de investigações sobre corrupção
como as que envolvem 2,3 mil políticos em relações incestuosas com os
grupos JBS e Odebrecht. Em jogo está a validade de três dezenas de
delações vitais nos inquéritos e processos da Operação Lava-Jato e
apurações derivadas, como as do setor elétrico que atingem o coração do
PMDB do presidente Michel Temer, dos senadores Renan Calheiros, Edison
Lobão e Romero Jucá, entre outros, além do PSDB do senador afastado
Aécio Neves.
O julgamento será
retomado hoje. Já são dois os votos declarados contra a tese defendida
por Mendes, o juiz do Supremo com mais visibilidade nos bastidores da
política e com um grupo fiel de seguidores nos plenários de tribunais
superiores. O desfecho é imprevisível, até porque juízes que já votaram
podem mudar de opinião, mas ontem era possível vislumbrar uma tendência
de maioria no STF contra ressalvas ou nulidade dos acordos realizados
pelo Ministério Público Federal.
Caso a maioria do
Supremo tivesse decidido ontem mesmo, questionando os acordos de delação
negociados pelo procurador-geral, Rodrigo Janot, como desejava Mendes, o
país acordaria hoje sob efeito de um forte estresse político-judicial.
Isso porque teria sido jogada na incerteza o futuro da Lava-Jato e
operações derivadas de repressão à corrupção.
Em consequência,
teria aumentado o nível de insegurança jurídica numa nação reconhecida
pela tradição de impunidade dos dirigentes políticos e cujos tribunais
encontram-se, literalmente, soterrados em processos não decididos:
quatro em cada dez que habitam as cadeias, todos pobres, são presos
provisórios à espera de sentença definitiva; nos protocolos dos
tribunais já são 986,7 mil as ações paralisadas à espera de regras de
aplicação da “repercussão geral” determinada pelo STF nos mais variados
temas.
Ontem, se tudo
tivesse saído como esperava Mendes, o Supremo teria replicado o
precedente que ele mesmo criou duas semanas atrás, no Tribunal Superior
Eleitoral, ao decidir o destino dos réus Michel Temer e Dilma Rousseff,
em processo por abuso de poder na eleição presidencial de 2014. Sobre
mesa havia um excessivo conjunto de provas, mas o juiz Mendes argumentou
que entre a sanção prevista em lei a possibilidade de ampliar a
instabilidade política no país, preferia ficar com a circunstância
política.
Na essência, o quadro
se repete no caso em julgamento no Supremo. A delação do grupo JBS
contra o presidente, cinco ministros, quatro governadores, seis
senadores e 15 deputados federais, entre outros governantes. No
Congresso, entende-se que a nulidade dos acordos de colaboração
equivaleria à transformação do Judiciário em virtual poder Moderador,
com revogação da autonomia constitucional do Ministério Público. O voto
de Mendes, hoje, pode influenciar a maioria no plenário — contra ou a
favor dele.
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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