Luiz Felipe
Pondé critica a vocação populista da democracia, mas, invocando
Churchill, pergunto se há alguma alternativa. O problema é reduzir a
democracia ao processo eleitoral, pois tiranos também são eleitos, como
Chávez, Maduro et caterva (não excluamos Lula, com sua vocação pela
tirania). Será que não devemos pensar o conceito de democracia
historicamente, com alguns ingredientes a mais, como a manutenção das
instituições, a independência dos poderes etc.? O problema, de fato, é o
povo, o eleitor - cuja ignorância, em geral, é a maior fraqueza da
democracia. Mas quais são as alternativas?
O
populismo é a vocação mais antiga da democracia. Sim, a democracia tem
uma vocação irresistível ao populismo. As mídias sociais são a
ferramenta mais poderosa que o populismo jamais teve. E uma das causas
mais poderosas a favor do populismo é a busca da democracia perfeita.
Dizer
isso nada tem a ver com preferir regimes antidemocráticos, como pensam
os inteligentinhos quando falam de política. Pelo contrário, prestar
atenção ao "lado B" da democracia é uma forma essencial de evitar
regimes antidemocráticos.
Conhecer
o "lado B" da democracia é essencial se quisermos proteger seu "lado
A". Ao contrário do que pensa nossa vã filosofia do bem (produção
inteligentinha), é o reconhecimento das sombras que garante alguma luz
mínima sobre as coisas e nas coisas.
Como
diria o filósofo Darth Vader: só o olhar direto nos olhos do lado escuro
da força nos faz compreende-lo e saber como ele pode se tornar
irresistível.
Alexis
de Tocqueville (1805-1859), em seu essencial "Democracia na América",
chama atenção para o fato de que "o cidadão da jovem democracia
americana" ficava irritado quando ouvia uma crítica ao seu regime
político.
E assim é
até hoje, traço característico da relação dogmática que temos com o que
os pesquisadores Achen e Bartels descrevem em seu "Democracy for
Realists", da editora Princeton University Press, como "folk theory of
democracy" (teoria popular da democracia).
Não vou
seguir precisamente os autores aqui, nem o que estou dizendo sobre o
lado B da democracia é necessariamente o que os autores pensam, mas a
leitura desse livro pode ajudar a você não cair nesse lado B da
democracia de forma tão ingênua.
Esta
teoria "folk" acredita em mitos como crescimento da consciência política
mediante a educação. Ou que as pessoas estão interessadas em política.
Esta lenda da democracia crê que as pessoas não só estão interessadas em
política como se informam para ter mais consciência política. Não. Elas
raramente buscam informação e, quando o fazem, o fazem pra reforçar
seus próprios pressupostos e não para relativiza-los.
As
mídias sociais deixam isso muito claro: não existe debate, existe ódio. E
o ódio, sabemos, é uma das formas mais perenes da alma se reconhecer
viva.
E os
intelectuais, professores ou profissionais ligados a política, apenas
pregam suas próprias concepções políticas. Quanto mais engajado, mais
fiel e fanático.
Professores,
em grande parte, não produzem nenhuma "consciência política ou
histórica", produzem, apenas, intolerância intelectual a bibliografias
que não gostam. Logo, não são "motores" de nenhuma suposta consciência
política.
Jornalistas e artistas seguem de perto a tendência à intolerância intelectual movida por adesão a dogmáticas políticas.
E qual a
razão da democracia ter vocação irresistível ao populismo? Fácil de
responder. A busca de conhecimento não é algo evidente em nós. A vida é
muito dura para nos darmos a esse luxo.
O que
buscamos, na maior parte das vezes, como diz o filósofo Woody Allen em
seu maravilhoso "Crimes e Pecados", são racionalizações que justifiquem
nossos desejos.
O
populismo se alimenta de nossa infantilidade. Queremos soluções claras e
distintas para a confusa realidade em que vivemos. "Alguém que coloque
Brasília em ordem", "alguém que faça justiça".
O trono por excelência do amante do populismo é a cadeira da sua sala em casa, na frente da televisão, xingando todo mundo.
O
populista mais "contemporâneo" tem um novo trono: as redes sociais,
através da qual distribui seus xingamentos. Nas redes ele abraça seus
"conteúdos de pós-verdade" e os distribui "generosamente" ao mundo a sua
volta.
A
vocação primeira da democracia é o populismo. Só com muito esforço
resistimos a ele porque a política é confusa, ambivalente, sombria,
retórica, suja, enfim, humana, demasiadamente humana. Quem pede
plebiscito o tempo todo é um populista disfarçado de ovelha.
Não há
sabedoria alguma no povo. A sabedoria está nos detalhes e a fúria
política popular não tem vocação aos detalhes, mas apenas a shows,
fogueiras e linchamentos. (FSP).
BLOG ORLANDO TAMBOSI
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