O Tempo
Nada melhor para definir o atual perfil da classe política brasileira do que reconhecermos, em todos os níveis, que ela se acha na muda. Nos pássaros, trata-se do período que vem depois da reprodução, geralmente entre janeiro e maio de cada ano; eles perdem as penas, comem menos, têm seu metabolismo alterado e não cantam. Mais ou menos assim se veem nossos homens públicos: estão mudando, muitos de partido, outros de ideias, sempre ao sabor da própria conveniência ou do grupelho que os acompanha e sustenta.
Ontem, numa roda de pessoas de razoável conhecimento dos fatos, ninguém foi capaz de sugerir um nome que pudesse tomar pelas mãos a responsabilidade de conduzir um Brasil a cada dia mais desgovernado, mais debilitado e mergulhado num abismo sem volta como o que estamos assistindo. Quando se diz um nome, obviamente, não se admite ser um aventureiro, ou um produto de marketing político, ou um falastrão apaixonado pela própria imbecilidade. Também não se cogita de um golpe militar, uma quartelada, porque se a crise evoluiu para piorar os civis, ela também arrastou os militares. Alastrou-se. Piorou geral.
O que dizer de um momento em que não se consegue identificar num Congresso de quase 600 senadores e deputados um, dois ou três nomes, para haver disputa, que traga nas mãos um programa confiável, concebido com responsabilidade especialmente em relação à garantia de seu cumprimento, no qual seja origem e destino a sociedade brasileira, na sua amplitude? Programas de partidos no Brasil sempre foram peças escritas para formalizar seu registro legal. Alguém sabe o que defendem nossos quase 40 partidos políticos? Pelo que lutam? Ninguém, especialmente seus membros e, mais especialmente ainda, se pesquisarmos suas ações. Nossos partidos são ajuntamentos, acampamentos de interesses e de brigas menores.
O TEMPO NÃO PARA
O tempo passa e suas consequências são implacáveis. A inflação vai bater 12% neste ano; podemos esperar. Os juros bancários, para matar os tomadores de cartões de crédito e do cheque especial chegaram a 500% ao ano. Mais do que uma imoralidade, um crime de que deveriam merecer julgamento sumário os nossos banqueiros, para condená-los à pena de morte. Saúde, educação, segurança e infraestrutura sem verbas para seu atendimento, ainda que da forma precária como faz o poder público.
Mais de 100 mil estabelecimentos comerciais foram fechados no Brasil nesses últimos meses. A indústria não produz e não entrega produtos atualizados porque não tem fomento; tem a fome que lhe impõe uma carga tributária monstruosa, uma legislação trabalhista que inviabiliza as relações dos empregados com seus empregadores, o ativismo de pseudo-ambientalistas enfurnados em conselhos, câmaras, ONGs, montadas, na sua grande maioria, para fabricar consultores e facilitários.
Nesse quadro de miséria o que se discute em Brasília? Se o STF vai processar e mandar prender Eduardo Cunha e Renan Calheiros, em cela única ou separada; se o melhor para o país seria o impeachment de Dilma, ou a cassação da chapa eleita Dilma/Temer; se o Delcídio deve ou não voltar ao Senado. E eu, você, nós, os comuns, pagando a conta. Nós também somos responsáveis. Somos a expressão da muda.
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