MEDIÇÃO DE TERRA

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domingo, 4 de agosto de 2013

Casarão da família Pires foi 'primeiro hotel de luxo' de João Pessoa


Mansão na Avenida Epitácio Pessoa hospedou artistas, políticos e atletas.
Local foi palco de muitas histórias que são contadas atualmente.

Juliana Brito Do G1 PB

Marcus Pires é o filho mais velho do casal e conta como era viver na mansão da Epitácio Pessoa (Foto: Juliana Brito/G1)Marcus Pires é o filho mais velho do casal e conta
como era viver na mansão da Epitácio Pessoa
(Foto: Juliana Brito/G1)
A casa da família Pires – uma das mais ricas de João Pessoa entre as décadas de 1960 e 1980 – serviu de hospedagem para autoridades, artistas e atletas que visitavam a cidade, em uma época em que ainda não havia hotel na capital. A história da ‘mansão dos Pires’ teve início em 1963, com o início da construção da residência do casal de empresários Creusa e Adrião Pires e dos três filhos deles, Marcos, Davi e Daniel, na Avenida Epitácio Pessoa, principal via de ligação entre o Centro e a orla até hoje.

Com mais de mil metros quadrados de área, construída em um quarteirão, a casa ficou pronta em 1965. Naquele mesmo ano, o então governador da Paraíba, João Agripino, que era amigo de Adrião Pires, pediu ao empresário que hospedasse o governador de São Paulo na época, o Brigadeiro Faria Lima, que visitaria a cidade para tratar de assuntos governamentais.

A partir de então, a mansão passou a ser o cenário de muitas histórias, contadas ao G1 pelo filho mais velho de Creusa e Adrião, o advogado Marcos Pires. “Como João Pessoa, nesse período não tinha hotel (somente passou a ter em 1970, com a construção do Hotel Tambaú), todas as autoridades, todos os artistas e até outras pessoas que não eram conhecidas ficavam hospedadas na casa dos meus pais”, afirmou Pires.
Ele lembra que, entre os políticos que foram recebidos pela família naquele período estão os ex-presidentes Castelo Branco e Costa e Silva. “O governador João Agripino, sempre que precisava, pedia ao meu pai que hospedasse as autoridades. Não tinha outro local com aquela estrutura”, justificou o advogado.

Segundo o Marcos Pires, durante cinco anos, a família também hospedou artistas, a exemplo de Roberto Carlos, Jô Soares, Vinícius de Moraes, Toquinho, Elza Soares, Paulo Autran, Maria Creuza e Altemar Dutra. “Eles vinham fazer show no Clube Cabo Branco, que, coincidentemente, ficava em frente à nossa casa. Outros, faziam show aqui e em Recife e acabavam não se hospedando. Mas, passavam por lá, como é o caso de Chico Buarque”, revelou.
Uma das histórias mais marcantes, de acordo com Pires, foi protagonizada pelo poeta e cantor Vinícius de Moraes. “Ele passou uma semana. Veio fazer um show. Acabou fazendo um segundo show. Acordava todo dia, ia para a beira da piscina. Ele comprou, ou alguém deu de presente, um casal de canários, que ele botava no trampolim, sentava, e, às 10 horas da manhã, começava a tomar uísque. Aí, passava o dia inteiro conversando, fazendo aquelas musiquinhas”, lembrou o advogado, ressaltando que os cantores Toquinho e Maria Creuza também passaram a semana na casa, nessa mesma ocasião.

Jô Soares foi outro hóspede conhecido que também ficou hospedado durante uma semana na casa dos Pires. “De vez em quando Jô Soares lembra, no programa dele, que ficou em uma casa em João Pessoa que tinha um bocado de sapos. E tinha mesmo, muitos sapos”, revelou Marcos Pires.
Vinícius de Morae veio fazer um show e acabou passando uma semana."
Marcos Pires, antigo morador
Outro fato inusitado, relacionado aos artistas que passaram pela mansão da família, foi a visita do cantor Roberto Carlos. “As pessoas pensavam, quando Roberto Carlos vinha para João Pessoa, que ele iria ficar hospedado na minha casa. Daí, a gente notava que ele estava para chegar, quando, de repente, alguns amigos que há muito tempo não se chegavam, começavam a cumprimentar, a chamar para jantar, para almoçar. Então, eu chamo isso de ‘fator Roberto Carlos’”, contou, revelando que o artista se hospedou somente uma vez na mansão.

Como filho mais velho, Marcos era responsável por receber e acompanhar os hóspedes, pois os pais dele estavam quase sempre trabalhando, inclusive aos domingos. Ele afirma que a sala de estar da residência era o ambiente preferido dos convidados. Havia uma porta de vidro que separava os quartos do ambiente social, que ficava isolado acusticamente.

“Quando estava em casa, mamãe fazia tudo. Chegava na sala de camisola, dizia para todo mundo ficar à vontade. Mandava a cozinheira fazer comida, mandava abrir a adega, servia todo mundo e ia dormir. Acordava no outro dia de manhã, e, às vezes, a festa ainda estava acontecendo. Era muito comum, de manhã cedo, mamãe e papai tomarem café com o pessoal que estava vindo da festa ainda, da véspera”, relatou Pires.
Parte dos móveis que o advogado tem hoje em seu escritório são da velha casa da família (Foto: Juliana Brito/G1)Parte dos móveis que o advogado tem hoje em seu escritório são da velha casa da família
(Foto: Juliana Brito/G1)
Durante uma das viagens do casal Creusa e Adrião, a trabalho, chegaram, de uma só vez, à casa da família, a seleção cearense juvenil de vôlei feminino e a cantora Elza Soares, acompanhada dos músicos que formavam sua banda, conforme revela Marcos Pires. “Era tanta gente que uma vez eu tive que ‘rachar’ um quarto com meu irmão mais novo e o cantor Altemar Dutra”, comentou.

Embora a família contasse com oito empregados (além dos motoristas), que moravam na mansão, e que preparavam comida e serviam os convidados, às vezes, o estoque de mantimentos não era suficiente. “Meu pai tinha uma conta no (restaurante) ‘Cassino da Lagoa’. Eu ligava e eles vinham entregar em casa. Ninguém pagava nada. Era tudo por conta dos anfitriões”, disse.

Segundo Marcos Pires, muitos artistas e autoridades que passaram pela mansão se tornaram amigos da família e mantinham contato por carta ou telefone. “Acontecia de tudo na casa. Muita coisa a gente nem lembra, ou nem sabe que aconteceu, já que ali era o ponto de reunião do que existia de poder na Paraíba. Não dá para mensurar”, conclui.
Descrição da casa
Em uma descrição minuciosa da casa, Marcos Pires relembra: “meu pai construiu uma casa fantástica, toda forrada com lambris de jacarandá; com oito suítes enormes, todas com banheira no banheiro; duas salas (sendo a principal com 200 metros quadrados); um gabinete; seis garagens; um terraço com 200 metros quadrados de área, um jardim com paisagismo e todo o piso era em mármore importado”.

Além disso, destacou o advogado, na casa foi construída uma das primeiras piscinas do Estado e toda mobília foi feita sob medida, pela fábrica de móveis personalizados ‘Oca’. “Para se ter ideia da importância dessa loja, até hoje, só tem, em exibição, um exemplar dessa mobília, no Museu de Arte Moderna de Nova Iorque”, declarou Pires, ressaltando que, na cozinha do casarão, havia uma máquina holandesa de fazer gelo. “Naquele tempo, e até hoje, eu achava isso a coisa mais inovadora”, comentou o advogado.

Marcos Pires conta que a mansão ficou com a família Pires até  o ano de 2005, quando foi vendida, junto com outras 20 casas e 10 apartamentos. “Todos os bens foram perdidos”, lamentou o advogado, referindo-se à falência do casal de empresários Creusa e Adrião, que, por mais de duas décadas esteve entre os mais bem sucedidos da Paraíba. Após passar por várias reformas, o casarão foi transformado em uma escola particular.

“Era uma casa de sonho. Não sei como deixaram derrubar”, lamenta Marcos Pires, que se tornou advogado porque precisou defender o pai em causas judiciais decorrentes da falência da família, que não já não tinha condições financeiras para pagar um advogado. Os outros dois filhos do casal também estudaram advocacia.

Além das memórias, o advogado conserva em seu escritório de advocacia alguns móveis da mansão onde morou durante a infância e parte da juventude, a exemplo da mesa de jantar, de uma estante e de um jogo de sofá e poltronas ‘Oca’.

Sobre a mãe, ‘dona Creusa’ (forma como era conhecida na cidade) Marcos Pires resume: “Mesmo quando era muito rica, minha mãe sempre foi simples. Ela só tinha um par de sapatos e dois vestidos”. Creusa Pires morreu no dia 3 de maio de 2009, aos 81 anos. Ela não resistiu a uma cirurgia para a retirada de um linfoma. Adrião Pires morreu em 29 de abril de 2012, aos 89 anos, vítima de problemas pulmonares.
Sem fotos
A maioria dos registros fotográficos das família na época da mansão se perderam recentemente. "Minha mãe guardava muito bem todas as fotos em uma caixa. Quando ela morreu, a caixa ficou guardada com o meu pai. Mas quando meu pai morreu, aí, na mudança, as fotos se perderam", conta com tristeza Marcos Pires.

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