MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

domingo, 7 de julho de 2013

Fábrica no Egito aproveita retalhos e produz calcinhas a jovens africanas


Projeto de canadense já fabricou 60 mil kits de calcinhas e absorventes.
Sem item, garotas perdem dias de estudo, diz empresária.

Gabriela Gasparin Do G1, em São Paulo

Jovens do Malauí costuram suas próprias calcinhas em projeto onde Rachel tem parceria (Foto: Divulgação/Transformation Textiles/Anna Ebert)Jovens do Malauí costuram calcinhas em projeto
onde Rachel tem parceria (Foto: Anna Ebert/
Divulgação/Transformation Textiles)
Desde 2010, a empresária canadense Rachel Starkey reaproveita retalhos da pequena confecção que possui no Egito e fabrica calcinhas e absorventes a um baixo custo para ajudar jovens mulheres africanas que não têm acesso ao tipo de acessório íntimo. Já foram fabricados aproximadamente 60 mil kits femininos destinados ao Malauí, Quênia, África do Sul, Camarões, Gana e Afeganistão.

A ideia surgiu após Rachel ver pilhas de sobras de tecido em sua fábrica e pensar como poderia reaproveitar o material. “Estávamos fazendo modernas fraldas de pano com um tecido caro, que era impermeável e absorvente. Quando os retalhos começaram a empilhar mais e mais, parte de mim sabia que algo precisava ser feito com essa sobra. Na época, eu não sabia o quê. Nós tivemos várias ideias, desde almofadas para trocar fraldas ou lenços para limpezas pessoais. Mas o mais emocionante foi quando descobri como fazer um absorvente reutilizável para mulheres”, afirmou, em entrevista ao G1.
Calcinhas são ajustáveis para diferentes tamanhos de corpo (Foto: Divulgação/Trandformation Textiles)Calcinhas são ajustáveis para diferentes tamanhos
de corpo (Foto: Divulgação/Transformation Textiles)
A fábrica da empresária, criada na Alexandria há 8 anos, tem aproximadamente 300 funcionários e fabrica produtos como fraldas de panos, suportes para carregar bebês (“cangurus”), artigos esportivos e de moda feminina. A empresa começou com três máquinas e hoje são 125, diz.
Ela conta que, há anos atrás, leu uma notícia sobre o impacto que a falta de acesso a absorventes íntimos causa nas jovens africanas, que perdem dias de estudo no período menstrual. “Só no Quênia, mais de 850 mil meninas perdem cerca de 6 semanas de escola a cada ano. O problema é ainda pior em toda a África Oriental, com quatro em cada cinco delas incapazes de comprar absorventes”, afirma Rachel.

Produção
Antes de colocar a ideia em prática, Rachel disse que pediu a funcionários de sua empresa que fizessem testes com as sobras do tecido impermeável. Ela tinha participado de cansativas discussões com representantes do governo sobre a quantidade de resíduos têxteis permitida na fábrica. “Eu estava cansada dessas longas discussões e perguntei a alguns dos meus funcionários o que eles poderiam fazer com a pilha de retalhos, explicando a eles como um absorvente simples poderia ser feito”, afirmou.
Quando os retalhos começaram a empilhar mais e mais, parte de mim sabia que algo precisava ser feito com essa sobra (...). O mais emocionante foi quando descobri como fazer um absorvente reutilizável"
Rachel Starkey
Rachel disse, porém, que “acabou esquecendo” da orientação que deu. “Dez dias depois, eu lembrei da minha instrução e fui perguntar o que eles tinham conseguido. Qual foi a minha surpresa quando vi que três deles tinham produzido 18 mil absorventes em dez dias”, afirmou.

A empresária revela que, na época, não tínha nenhum contato para a distribuição do produto, então passou a guardar as sobras para estarem prontos a produzirem o produto, se solicitado.

Para a fabricação das calcinhas, ela explica que o molde nasceu de uma fusão de ideias entre ela, dois membros de sua equipe e a proprietária de uma empresa canadense (sócia em seu projeto, chamada Lunapads). “Estávamos determinados a fazer um formato simples, mas eficaz, que se encaixasse praticamente em qualquer tipo de corpo, além de ser durável para suportar o sol intenso da África”, disse. O resultado foi um modelo que pode acomodar tanto um aboservente descartável quanto os feitos de pano impermeável, explicou.

As calcinhas, segundo ela, também são produzidas com retalhos da fábrica dela e de outras. “Os custos das matérias-primas são quase inexistentes porque os retalhos são gerados por indústrias”, diz. Ela afirma que aproveita pedaços de 3 a 6 metros de comprimento, que geralmente sobram nos finais de rolos de recido. “Esses retalhos são muitas vezes apenas jogado em locais de aterros ou queimados. Com bom planejamento, o trabalho de produção é tão rentável como outra produção  em massa”, disse.
Rachel Starkey tem uma confecção há oito anos no Egito (Foto: Divulgação/Transformation Textiles)Rachel Starkey tem uma confecção há oito anos no Egito (Foto: Divulgação/Transformation Textiles)
Distribuição
Com o tempo, a empresária afirma que desenvolveu kits com duas calcinhas e seis absorventes reutilizáveis, que podem ser vendidos por US$ 5.
Para fazer a distribuição, são encontradas empresas e entidades parceiras em cada país.

Em 2011, para tornar o projeto viável, Rachel criou a “Transformation Textiles (TT)”, um modelo de “empresa social híbrida”, explicou. “A TT é impulsionada pelo mercado em termos de ser capaz de oferecer um produto de alta demanda, a um custo baixo, ao alcance financeiro de muitas mulheres em países emergentes. Doações agem como ‘pontapé’ para aumentar a oportunidade e disponibilidade de programas”, diz.

Ela disse, contudo, que as entidades ajudam com a distribuição. Um exemplo é uma parceira no Quênia, chamada Zana África.
“Zana África planeja distribuir metade dos kits de forma gratuita para meninas na escola. A outra metade, eles vão criar um modelo de vendas, proporcionando um micro-negócio para as mulheres que querem alcançar a independência financeira. No final, o lado das vendas será capaz de cobrir os custos dos kits doados, criando uma capacidade sustentável e permanente para proporcionar a fabricação de mais calcinhas.”
Itens a serem enviados nos próximos meses ao Malauí (Foto: Divulgação/Transformation Textiles)Remessa a ser enviada nos próximos meses ao
Malauí (Foto: Divulgação/Transformation Textiles)
Cobertores para refugiados
A empresária, contudo, afirma que sua confecção sempre teve a preocupação com o aproveitamento de materiais. “Tentamos não desperdiçar nada, se possível. Estamos sempre à procura de maneiras originais para reutilizar materiais em vez de simplesmente eliminá-los”, diz.
Em outro projeto, ela afirma que foram fabricados cobertores e roupas para refugiados na África, também com sobras de material. “Em 2009, nós fizemos uma parceria com uma ONG que trabalha com refugiados. Fizemos centenas de cobertores, roupas de bebês e gorros de inverno. No ano seguinte, estávamos prontos para um pedido de aproximadamente 4 mil cobertores”. Segundo ela, dois de seus filhos pequenos conseguiram, inclusive, levantar 30% dos custos com doações de colegas na escola.
A empresária diz, ainda, que o que a estimula em seu projeto é pensar em cada uma das jovens africanas, que deixam de ir a escola por não terem absorventes. “O que você faria se não tivesse a proteção que precisa? Pense em sua filha enfrentando a opção de não ir à escola ou conseguir essa ‘proteção necessária’ em troca de favores ou serviços sexuais?”, questiona.

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