MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

quarta-feira, 22 de maio de 2013

Barbosa, o homem errado dizendo as coisas certas

Palavras certas ditas pelas pessoas erradas em erros se transformam. Isso é tão verdadeiro que o contrário é impossível: pessoas certas dizendo coisas erradas não tornam acertos os erros. Reflitam um pouco. Não se trata de mero jogo de palavras. Isso vale para ministros do Supremo a opinar sobre assuntos que estão fora de sua alçada — ainda que digam as coisas certas — ou, sei lá, para médicos ou sacerdotes. Querem ver? Eu, católico que sou, acho que a oração faz bem. Rezar é um jeito de limpar a sua crença da fuligem do dia, que a vai turvando, de rever seus próprios valores, de repensar suas próprias atitudes. Assim, digo eu, aos que creem: rezem que faz bem! Mas me parece impróprio, ainda que, segundo penso, correto em si, que um médico diga a seu paciente, ao se despedir: “E olhe, trate de rezar bastante!”. É o que chamo de coisa certa na boca errada. NOTA À MARGEM SÓ PARA NÃO DEIXAR PASSAR – “E exemplo do segundo caso, Reinaldo, de gente certa dizendo a coisa errada? Tem?” Tenho. Pegue-se o mesmo sacerdote. É a pessoa certa para recomendar que alguém faça as suas orações. Mas seria um erro danoso que ele recomendasse aos fiéis que dispensassem o tratamento médico, confiando na oração.
Por que isso? Joaquim Barbosa, ministro do Supremo e presidente do tribunal, proferiu uma palestra a estudantes. Disse coisas certas, em si. Segundo ele, os partidos brasileiros são frágeis e distantes do eleitorado. Leiam reportagem de Laryssa Borges e Marcela Mattos, na VEJA.com. Afirmou:
“Nós temos partidos de mentirinha. Nós não nos identificamos com os partidos que nos representam no Congresso, a não ser em casos excepcionais. Eu diria que o grosso dos brasileiros não vê consistência ideológica e programática em nenhum dos partido”. Segundo ele, nem os partidos políticos nem os próprios dirigentes partidários “têm interesse em ter consistência programática ou ideológica”. E resumiu: “Querem o poder pelo poder”.
Está essencialmente certo, embora eu discorde dessa história de “poder pelo poder”. Fosse assim, eu estaria mais tranquilo. Com frequência, querem o poder para cuidar dos próprios interesses e dos de sua turma. Barbosa também defendeu o voto distrital, com o que concordo:
“O Poder Legislativo é composto, especialmente a Câmara dos Deputados, que é a mais numerosa, em grande parte por representantes pelos quais não nos sentimos representados por força do sistema eleitoral adotado no Brasil, que trunca as eleições, que não contribui para que tenhamos uma representação clara, legítima (…) A solução seria a adoção do voto distrital, voto em que, para a Câmara dos Deputados, teríamos que dividir o país em 513 distritos, e cada cidadão residente em um distrito iria votar em uma pessoa que ele conheça, de quem ele possa cobrar”.
Diagnóstico, até onde foi nesse particular, impecável! A questão, no entanto, é esta: é ele o homem certo para dizer essas coisas? A resposta é “não”. Cria mais calor do que luz; mais confusão do que clareza; mais contratempos do que soluções.
“Ah, o fato de ele ser ministro do Supremo não o impede de ter uma opinião.” Repetirei o mesmo que disse sobre a ministra Maria do Rosário: se Barbosa opinar que é melhor dividir em dois o biscoito recheado, ninguém tem nada com isso. Os temas sobre os quais falou, no entanto, são de interesse público, dizem respeito a outro Poder e fatalmente acabarão esbarrando em votos que terá de dar um dia. Nesse caso, convém calar-se ou ser mais genérico: “Caberia ao país discutir a questão da representação…”. Há, enfim, modos de fazer a coisa.
Barbosa expressou ideias em si corretas, mas com erro de pessoa. Especialmente porque está na Presidência de um Poder. Aplaudo o conteúdo do que disse, mas aponto a inoportunidade de pessoa.
Por Reinaldo Azevedo

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