'Passamos a considerar algo que antes não fazia sentido pensar', diz fonte da área técnica; por enquanto, risco maior é de aumento das tarifas
JOÃO VILLAVERDE, LU AIKO OTTA / BRASÍLIA, RENÉE PEREIRA / SÃO PAULO - O Estado de S.Paulo
Tachada como "ridícula" pela presidente Dilma Rousseff há
duas semanas, a hipótese de racionamento de energia entrou no radar do
governo com a constante queda dos níveis dos reservatórios. "A questão é
que agora passamos a considerar algo que antes não fazia sentido
pensar", disse uma fonte da área técnica. "O nível dos reservatórios
está baixando, então não podemos fechar os olhos."A possibilidade de se repetir em 2013 o "apagão" de 2001 é, porém, considerada pequena tanto no governo quanto no setor privado, embora a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace) tenha sugerido ontem que os grandes consumidores avaliem "a redução voluntária de suas demandas neste momento", numa espécie de racionamento "branco".
O risco maior é de aumento nas tarifas. Nesse caso, o corte nas contas de luz prometido pela presidente Dilma em rede de rádio e TV, em setembro, pode ficar menor do que o originalmente estimado, já que as térmicas - mais caras - continuarão em operação por mais tempo.
O Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), órgão do governo responsável por acompanhar e avaliar o suprimento de energia no País, se reúne amanhã para avaliar a situação. O Ministério de Minas e Energia diz que é um encontro rotineiro, já agendado. Ainda assim, houve nervosismo no mercado financeiro.
Ontem, as ações da Eletrobrás (PNB) caíram 4,72%, com queda de 0,94% no Ibovespa. Papéis de outras empresas também recuaram, como Copel PNB (2,77%), Eletropaulo PN (3,43%), Cesp PNB (3,4%), Cemig PN (3,33%) e CPFL ON (3,29%).
Apesar do início do período úmido, o nível dos reservatórios só cai desde novembro. A expectativa era que as chuvas de dezembro melhorassem o nível dos lagos. Mas a combinação entre volume baixo de água e consumo elevado com o calor piorou a situação. No subsistema Sudeste/Centro-Oeste, que tem 70% do armazenamento do País, os reservatórios estão em 28,5%.
"Estamos ficando viciados em acompanhar os mapas meteorológicos para ver se a situação muda. Mas, até agora, o cenário não se alterou", diz Marcelo Parodi, da comercializadora Compass. Segundo ele, a instabilidade das chuvas em janeiro está muito grande, o que não é bom.
"O que ocorrer em janeiro em termos de hidrologia definirá a condição do sistema", diz o presidente da Associação Brasileira de Empresas Geradoras de Energia Elétrica (Abrage), Flávio Neiva. Ele avalia que, se as chuvas não voltarem ao nível normal, vai "acender o sinal amarelo". Não significa que haverá racionamento, mas sim que o governo terá de tomar providências.
Tarifas. Por ora, a única certeza que se tem é que o custo da energia será impactado pelas térmicas em operação desde outubro. Fato que "já está atrapalhando" os planos de Dilma de cortar as tarifas em 20,2%, disse Neiva. Cálculos da Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica (Abradee) mostram que em outubro e novembro o País gastou cerca de R$ 1,3 bilhão para manter a operação das térmicas. Em dezembro, a conta deve ter ficado em R$ 800 milhões.
Na média, isso significa impacto em torno de 1% ao mês nas tarifas do consumidor (quase 3% até agora). "Ninguém pode dizer que vai ou não vai ter racionamento. Mas a situação é delicada e o custo deve aumentar com as térmicas", diz o presidente da Abradee, Nelson Fonseca Leite.
Para o BTG Pactual, o acionamento das térmicas por mais tempo poderá elevar em 14% as tarifas. Relatório do analista Antonio Junqueira informa que um racionamento não é esperado, e sim uma "forte pressão nos preços da energia". / COLABORARAM EULINA OLIVEIRA, EDUARDO RODRIGUES e WELLINGTON BAHNEMANN
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