MEDIÇÃO DE TERRA

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MEDIÇÃO DE TERRAS

quinta-feira, 10 de maio de 2012

Paraibanos mantêm hábito de conversar com vizinhos nas calçadas


Moradores fazem da calçada de casa a sala de estar.
Costume muito comum no interior sobrevive na capital.

Frederico Martins Do G1 PB
Família Alexandre Paraíba (Foto: Frederico Martins/G1)Aposentada Valdeni Alexandre tem o hábito de sentar todas as noites na porta de casa, e também costuma realizar reuniões com a presença de toda família nas sextas-feiras (Foto: Frederico Martins/G1)

Fim de tarde, comecinho da noite, às vezes após o jantar, alguém puxa uma cadeira da varanda e senta na calçada em frente de casa. Não demora muito aparece um filho, um neto, uma vizinha, a conversa se estende e ganha a noite, dando ares de ritual a um momento que não pode faltar no cotidiano de muitos brasileiros, sobretudo na Paraíba.
O hábito de colocar cadeiras na porta de casa para conversar com parentes e vizinhos é bastante antigo, e até parece nostálgico, remontando cenas da infância, principalmente para quem cresceu no interior, onde os vizinhos se conhecem intimamente e compartilham amenidades enquanto as crianças brincam na rua sem medo de assaltos ou acidentes de trânsito.
Porém, se engana quem pensa que esse comportamento é exclusivo ou típico das cidades pequenas. Em João Pessoa, a espontaneidade do hábito, pode ser observada em vários pontos da cidade, dos Bancários à Jaguaribe, de Mangabeira à Torre.
Em uma volta pelas ruas do Tambiá, um dos bairros mais antigos e cheio de histórias da capital paraibana, é possível constatar vários exemplos de que esta forma de interação social ainda faz parte do cotidiano de muita gente. Mesmo apesar do novo contexto social, que inclui insegurança, maior fluxo de carros nas ruas e até mesmo o uso de novas ferramentas de interação, como as redes sociais na internet.

Mas nada disso representa qualquer impedimento para a família da estudante de enfermagem Josefa Alexandre, que todas as noites se reúne na calçada de casa para conversar, observar o movimento da rua e desfrutar do ar fresco, sobretudo nas noites mais quentes. A mãe da
estudante, a aposentada de 75 anos, Valdeni Alexandre, disse que senta na calçada todos os dias e que não há qualquer perigo.
“Só não venho aqui quando está chovendo, fico até nove, dez horas da noite. Depende do povo, fico conversando com os vizinhos. Até quem mora aqui perto passa e fica aqui conversando uma meia hora”, disse dona Valdeni.

Por morarem todos próximos, os filhos, filhas, noras e netos da aposentada são presença certa na calçada dela. O grupo até realiza uma reunião familiar todas as sextas-feiras, na frente de casa. Josefa Alexandre comentou ainda que é comum presenciar um ou outro acidente
de trânsito, mas nada que ofereça qualquer perigo para a família.
Na mesma rua da família Alexandre, encontramos a cozinheira de 37 anos Luciana dos Santos, que também senta na calçadinha de casa com assiduidade.
Luciana personagem 1 (Foto: Frederico Martins/G1)A dona de casa e cozinheira Luciana Santos
compartilha momentos inusitados de interação
com vizinhas e colegas (Foto: Frederico Martins/G1)
“Antigamente, todos os dias a gente ficava na porta de casa, gostava de ficar aqui, de conversar, olhar o movimento, mas
agora que minhas meninas cresceram, a gente fica mais dentro de casa, mas duas ou três vezes na semana eu sento aqui na porta, o bairro é bem tranquilo e não tem perigo nenhum a gente ficar até mais tarde”,  disse Luciana.
Apesar da tranquilidade, Luciana afirmou que toma certas precauções como não ficar na calçada até depois de meia-noite, para evitar assaltos, e nem durante os finais de semana, onde os riscos de um motorista ou motoqueiro embriagado subir na calçada são maiores.
“Uma vez a gente entrou e deixou minha irmã na porta de casa enrolada em um lençol, porque ela toda hora dizia que iria entrar pra dormir, mas acabou dormindo aqui na frente. Enquanto a gente entrou, um carro passou e o motorista gritou: 'esqueceram de tu, fofoqueira?'”, contou Luciana, lembrando de um dos momentos inusitados das reuniões na calçadinha de casa.
Já a outra vizinha de Dona Valdeni, que também estava sentada na porta de casa, comentou temer que algum carro descontrolado pudesse subir em sua calçada. “Eu gosto de sentar aqui e tomar um ventinho. Todos os dias eu me sento aqui, mas a minha mãe sempre dizia para não ficar muito tempo. Uma vez um carro veio e quase subiu na calçada. Ela ainda tem o maior medo de ficar aqui na frente”, disse a dona de casa Severina Gonçalves.
severina personagem 2 (Foto: Frederico Martins/G1)Apesar de temer acidentes, a dona de casa Severina Gonçalves mantém o hábito de bater papo todas as noites na calçada de sua residência (Foto: Frederico Martins/G1)


De acordo com o sociólogo Moisés Costa Neto, esse hábito fortalece os laços sociais entre as pessoas e permite o aprofundamento das relações. "Primeiro, é preciso que se diga que, para a Sociologia, a socialização não desapareceu ou diminuiu, ele apenas tomou novas formas, como a virtualidade, por exemplo. Os laços sociais se constroem principalmente pelo lugar comum em que moram as pessoas. As cadeiras na calçada reforçam esses laços, porque permite que se aprofundem as relações por meio do diálogo, que possui uma função agregadora e identitária subestimada pelas pessoas. Conversar com os vizinhos na calçada significa reconhecer o outro como um semelhante e, ao mesmo tempo, policiar os comportamentos desviantes da vizinhança", explicou o sociólogo.

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