MEDIÇÃO DE TERRA

MEDIÇÃO DE TERRA
MEDIÇÃO DE TERRAS

sexta-feira, 20 de abril de 2012

Produtores sofrem prejuízos com disputa por terras no sul da Bahia


Índios já ocuparam 68 fazendas e desejam tomar 54 mil hectares na região.
Fazendeiros reclamam da perda de espaço para plantio e pecuária.

Do G1 BA, com informações da TV Bahia

A disputa entre índios e fazendeiros por terras na região sul da Bahia tem alterado a rotina nas cidades e a fonte de renda de produtores e empregados há quase três meses. “A queda no movimento do comércio passa dos 60%”, avalia o comerciante Djalma Duarte.
Os produtores se preparavam para a colheita nas fazendas de cacau invadidas. Nas propriedades com atividade pecuária, já passa de 23 mil cabeças o rebanho em poder dos índios. Parte do gado que os fazendeiros conseguiram retirar come em pastos alugados.
“Pago R$ 25 por cada cabeça de gado ao mês. Cavalo e égua, R$ 60. Um absurdo. Três vezes mais. Não estou aguentando mais. Vou ter que vender”, afirma o pecuarista Raimundo Oliveira.
Segundo os fazendeiros, há poucos pastos disponíveis pra alugar. Alguns criadores levam o gado para as faixas de capim que ficam nas margens das estradas.
Desde janeiro, os índios já invadiram 68 fazendas. Eles querem ocupar 54 mil hectares de terra, entre os municípios de Itaju do Colônia, Camacan e Pau Brasil.
Em Itaju do Colônia, foram invadidas todas as fazendas que, segundo a Fundação Nacional do Índio (Funai) estão dentro da área que seria da reserva indígena. No total, são 57 fazendas ocupadas só no município.
Segundo o sindicato dos produtores da região, mais de 500 trabalhadores rurais já foram demitidos nas propriedades tomadas pelos índios. “Já procurei [trabalho], só que nas fazendas vizinhas daqui, todas já têm seus empregados e não tem vaga”, relata o trabalhador rural Alison Regis.
Protesto
Estudantes, religiosos, comerciantes e donas de casa, realizaram uma passeata em Itaju do Colônia para pedir o fim dos conflitos entre indígenas e fazendeiros. Odília Oliveira, que perdeu a irmã há nove dias em um atentado na estrada, também participou da manifestação. “Nós não somos fazendeiros, não somos indígenas. Aí aconteceu esse fato com a gente e nós queremos justiça”, diz.
'Novas aldeias'
Em entrevista ao G1 na terça-feira (17), o cacique Nailton Muniz, um dos três da tribo Pataxó Hã Hã Hãe, disse que a área invadida será usada para construção de novas aldeias.
"Vamos criar novas aldeias. Devemos aproveitar a sede porque não vamos derrubar. Esperamos que os fazendeiros venham logo tirar os seus funcionários para que a comunidade possa se juntar e decidir o que será feito", afirma.
Já são 393 áreas em posse da comunidade indígena na Bahia nas últimas décadas, com média de quatro mil membros residentes, informa o cacique. "O que fez a gente tomar a decisão [de entrar nas fazendas] não é a lentidão no julgamento [da Justiça], é que o povo da comunidade cresceu e as áreas que os índios ocupavam não tinham condições de acumular todo mundo. Um outro problema grave é que muitas áreas que a Funai indenizou, os fazendeiros, muitas vezes, fecharam o acesso, e os índios não conseguem chegar às fazendas", explica.
O cacique afirma que os vaqueiros que permanecem nas propriedades estão à espera da retirada do gado pelos fazendeiros. Segundo ele, não há ameaça contra a vida dos trabalhadores e nem uso de armas pesadas, apenas aquelas que fazem parte da cultura de caça e defesa pessoal dos índios, como lança, arco, flecha ou tacape.
Garantia de território
Bahia (Foto: Reprodução/TV Bahia)Produtores usam vegetação às margens da pista
(Foto: Reprodução/TV Bahia)
Em nota à imprensa, a Funai informou que as ocupações são estratégicas para a garantia de posse do território tradicional do índio.
"Frente à espera de julgamento pelo Supremo Tribunal Federal da ação proposta ainda em 1982, os pataxó hã hã hãe passaram a ocupar, desde janeiro deste ano, áreas que se encontram no interior da terra indígena mas que ainda são exploradas por fazendeiros. A decisão é tomada pelas comunidades indígenas e embasada em seus laços culturais e afetivos com suas terras, enquanto não se efetiva a plena proteção territorial a que fazem jus".
A Funai aponta que os índios têm, constitucionalmente, garantida a proteção de terras no sentido de favorecer a qualidade de vida e os costumes da população. Também indica a recorrência de "graves" violações aos direitos humanos dos índigenas como a morte, segundo a Funai, por omissão de socorro, de José Reis Muniz de Andrade, em fevereiro deste ano. "A ocupação de áreas tem se mostrado como uma estratégia para grupos que se encontram impedidos de gozarem de seus direitos territoriais, especialmente em áreas em que há grave ameaça à qualidade de vida dos indígenas e do meio ambiente de suas terras. Por ordem constitucional, é garantida a proteção das terras indígenas com condições ambientais e sociais mínimas para a manutenção dos modos de vida desses povos, segundo seus usos, costumes e tradições", afirma a nota.
Pedido de nulidade
índio (Foto: Reprodução/TV Bahia)índios já ocuparam 68 fazendas no sul da Bahia
(Foto: Reprodução/TV Bahia)
Segundo o chefe da coordenação da Funai em Pau Brasil, Wilson Jesus de Souza, o objetivo dos índios não é a posse das terras, e sim, a nulidade dos títulos que garantem a posse aos fazendeiros. Ele afirma que, em abril de 1982, a Funai entrou com um pedido junto ao Supremo Tribunal Federal requerendo a nulidade dos títulos de terra que foram concedidos aos fazendeiros.
O representante da Funai explicou que os índios reivindicam 54.100 hectares, área que foi demarcada como território índigena entre 1937 e 1938. "Dez anos após a demarcação das terras, em 1948, o Serviço de Proteção ao Índio (STI), órgão que era vinculado ao Ministério da Agricultura, inicia um processo de arrendamento das terras para os fazendeiros. Nessa época os índios não tinham que aceitar ou não, eles simplesmente eram obrigados a se submeter a determinação do STI, porque o STI era quem coordenava, administrava e dava as ordens na terra”, afirma.
O coordenador da Funai conta que, na medida em que os fazendeiros recebiam as terras, os índios acabavam sendo expulsos. “Nesse período houve uma grande chacina de índios. Isso aconteceu entre 1938 e a década de 1970. Eram 50 mil índios nesse território e hoje existe pouco mais de três mil índios na região sul”, explica. Wilson ainda comenta que, em 1926, houve uma primeira tentativa de demarcar os 54.100 hectares como território indígena, mas acabou sendo barrado pelos fazendeiros que dominavam a região cacaueira na época.
Ele também relata que, na década de 1970, já não havia índios na região e apenas oito famílias indígenas conseguiram continuar morando em aldeia na região de Itaju do Colônia. Nessa época, vários líderes indígenas se reuniram e formaram uma comissão, que foi até algumas capitais brasileiras, entre elas, Salvador, Rio de Janeiro e Brasília, para reivindicar às autoridades a posse das terras que ficam no “Território Indígena Catarina Paraguassu”, informou Wilson Souza.
De acordo com o coordenador, em 1976, três anos após a criação da Funai, a antropóloga Maria Hilda Baqueiro Paraíso, da UFBA, produziu um relatório identificando os índios que moravam ou trabalhavam na região e, a partir do trabalho, a Funai, em 1982, reúne os índios que estavam dispersos em uma fazenda chamada São Lucas, área de 1079 hectares, e reembolsou o fazendeiro que estava na terra, área que já havia sido demarcada como território indígena. “A Funai achou que seria rápido o processo de reintegração e ingressou com uma ação de nulidade dos títulos que estavam dentro dos 54.100 hectares junto ao Supremo Tribunal Federal. A partir daí inicia a luta pelas terras e os Índios aguardam uma determinação judicial”.

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